Tal “golden rush”, agora temos a “Data Rush”. Aliados a uma bazuca, que curiosamente é uma arma de destruição que explode sem precisão, a última buzzword é “data”, dados, em bom português.
Em combinação com outras buzzwords como “meta” e “inteligência artificial” e a passagem de “CRM” para “CDM”. E para que servem estas buzzwords? Para engrandecer algo que por si só não tem valor e tornar complexo algo que é bastante simples, para, assim, aumentar o preço de um serviço àqueles cujos conhecimentos tecnológicos são limitados e que têm ainda o poder decisivo nas empresas. Soube de um hotel que estava a contratar análise de dados quando nem um sítio web tinha.
Os dados são outra bolha tecnológica
O valor dos dados não está na sua existência, por si só eticamente duvidosa, e a que a RGPD só fez umas festinhas, mas sim na derivação acionável da sua análise. Apareceu o trabalho de um “Data Scientist”, que nada mais é do que alguém que sabe interpretar dados e implementar uma estratégia para os recolher e retirar conclusões. E consta que é bem pago. Talvez devesse rever a minha carreira.
Em português diz-se “atirar areia para os olhos”, em inglês, “pull the wool over someone’s eyes”, é mais quentinho.
Os “cookies” no seu navegador favorito querem na realidade dizer trackers, ou rastreadores, que são instalados no seu computador e capturam os seus dados de navegação. Com a missão evangelista de ter o seu interesse em primeiro lugar, para lhe providenciar anúncios relevantes. Tal mordomo que o segue para todo o lado, e o vê a dormir, com uma bandeja na mão com sobremesas que já o enjoam. Apetece-lhe comer mais uma “bolacha”?
Dan Ariely, professor de psicologia e economia comportamental, afirma comicamente que “big data é como sexo adolescente: todos falam sobre isso, ninguém realmente sabe como fazer, todos pensam que os outros todos estão a fazê-lo, então todos afirmam que o estão a fazer.”
O pior é que com tantos dados esquecemo-nos de ouvir.
Sou um defensor acérrimo da análise de dados, para criar uma estratégia eficaz. Todavia, a captação desses dados também tem que partir de uma estratégia. Essa estratégia, por sua vez, faz parte de uma série de perguntas que queremos ver respondidas. Isto porque se obtivermos os dados primeiro, sem as questões certas, iremos cair em erro.
Na Segunda Guerra Mundial, fez-se um estudo para melhorar a armadura dos aviões de combate. A grande questão seria onde aplicar essa armadura nos aviões, para melhorar as hipóteses de sobrevivência e ao mesmo tempo não comprometer o seu peso. Os dados foram recolhidos dos aviões que sobreviveram a ataques, tendo-se analisado a localização dos buracos feitos pelos tiros inimigos. Quando estes dados foram apresentados a Abraham Wald, tendo sido apontados os buracos mais comuns a todos os aviões, sendo nas asas, Wald respondeu negativamente. A armadura iria proteger o motor. Porquê? Porque Wald analisou não só os dados que lhe foram apresentados, mas também os que faltavam. Os aviões analisados tinham sobrevivido, por isso os tiros nas asas não seriam tão debilitantes como um tiro no motor, sítio que não tinham tiros relatados, e esses aviões nunca tinham chegado a aterrar em segurança. O princípio é o mesmo se aplicarmos ao nosso marketing. Interessa saber o que os dados não nos dizem e porquê.
Os dados só são importantes se soubermos o que fazer com eles. Só são ouro se soubermos usar uma picareta.
Texto previamente publicado na Publituris