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O mês de agosto é, por norma, o mês do caos no Algarve. É o mês em que não se marcam reuniões, não se fala em investimento nem estratégia, porque o tempo é passado a suar a trabalhar no duro, sem folgas e com um sentimento de equilíbrio deturpado por uma iminente tragédia, especialmente este ano.

“Não há pessoas para trabalhar”. – Frase proferida por todos os profissionais do turismo, e não só.

Desengane-se quem pensa que esta falta é recente, estou no ramo há mais de dez anos e foi uma das primeiras coisas que me disseram. As razões apontadas pelo patronato é a de preguiça, que o desemprego é um benefício demasiado bom, ou que o peso dos impostos é demasiado para aumentar salários, pois a razão dos trabalhadores é que as condições são insustentáveis e há melhores noutros lugares.

Em que ficamos?

Em relação aos impostos dou, em forma de cotovelada, o mais recente e explícito exemplo das petrolíferas. Diminui-se os impostos, os preços continuam os mesmos e os lucros disparam para números astronómicos. Sei de grupos hoteleiros onde se atingiram números extraordinários e onde não só não se deram bónus ou aumentaram salários, como se extinguiram postos de trabalho. Penso que seria justo então baixarem-se os impostos só para os trabalhadores, que receberiam mais líquido, mas como a receita do Estado é vista como um bolo, alguém tinha que dar essa fatia.

Para o Algarve e, já também, para Portugal, o turismo é uma indústria que tem peso, mas não tem músculo. O turismo é visto como algo que é criado sem esforço, sem necessidade de grandes competências ou atenção governativa. É essa perceção errónea que induz uma falta de prestígio e de músculo forte o suficiente para carregar mudanças. Mas a culpa não é de quem não percebe nada de turismo.

O turismo é em todo o mundo, com algumas exceções (que se estão felizmente a disseminar), uma indústria tradicionalista. Não tivesse eu, enquanto diretor de marketing andar de fato. Confundimos rigor com aparências e qualidade com estrelas. O serviço, tão humano, é muitas vezes o último investimento. Este facto é difícil de contrariar, porque crescer dói e metodologias que estão para lá da idade da reforma e não funcionam no mundo atual, são difíceis de largar.

Eu entendo. Largar para quê, e para o quê? O risco de ser enganado, de não perceber, de não resultar. O risco. Falta entender que o risco não é sinónimo de perigo nem conforto de segurança. Muitas vezes o perigoso é confortável, porque ficaremos numa espiral descendente e o risco seria mais seguro porque poderíamos estar a crescer.

“Quem não arrisca, não petisca.”

Então vá, Guilherme, sabe-tudo, o que propões? Proponho o risco mais seguro de uma mudança de metodologias, e até ponho por pontos, para não te aborreceres ainda mais.

– Administração – Sei e compreendo que o bottom line é tudo o que vos interessa. Todavia, beber água quando se pode beber champanhe só se estivermos a tomar antibiótico ou num funeral. Aplica-se aos vossos lucros e ao investimento que precisa de ser feito nas vossas unidades. Se investirem podem estar a beber champanhe e não água. Investimento implica retorno, se não, é um custo. Vi tantas vezes a técnica de espremer a laranja para ter sumo, mas o Algarve apesar de ter produção de laranjas, estas agora são raras e não querem ser espremidas mais. Produza-se champagne.

– Recursos Humanos – Investir primeiro nas pessoas. Pague-se bons salários a bons funcionários. Compras para casa não se pagam com palmadinhas nas costas. Sejam mais humanos. Já existem estratégias de incentivo e recompensa, não só monetária, para motivar os colaboradores. Investir nas pessoas, para que queiram ficar, e para além disso, desejem vir trabalhar connosco.

– Sales & Marketing – Quantas empresas vejo que não sabem o que é uma marca? Quantas unidades hoteleiras têm maus conteúdos e maus websites? Sales & Marketing não é um custo, é um investimento. Se não estiver a ter resultados é porque foi mal feito. Invistam no Marketing e em Revenue. A empresa é um carro e este departamento são as rodas. Pode estar estacionado com pneus vazios ou pode ter pneus que o deixam atingir o máximo que o seu motor (operação) permite.

– Operação – Uma boa equipa é uma má equipa com um mau manager. Já vi, mais vezes do que gostaria, bons funcionários a serem maus no seu trabalho porque quem os coordena é bom no que faz, mas não tem quaisquer competências de liderança e gestão de pessoas. Continua a ser uma das principais razões de abandono das empresas. Falta humildade e assertividade para mudar. É, também, curioso o quão poucas vezes na minha carreira me perguntaram o que gostava de fazer. Fiquem a conhecer as pessoas, as suas competências e, ao invés de mandar, ajudem-nas a encontrar o que melhor sabem fazer e mais tiram prazer. Os meus funcionários mais felizes foram sempre aqueles a quem ajudei a encontrar mais tempo e mais responsabilidade a fazerem aquilo que gostam mais de fazer. Deixa de ser trabalho, e é aí que o serviço passa de mediano a excelente.

 

 

Texto previamente publicado na Publituris

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